quarta-feira, 19 de junho de 2013

Falta moral no mundo

"Com a sociedade descartada, há um vazio no mundo.
Vazio de educação, saúde, melhores salários, segurança.
É crime, o que o governo faz com nós.
Vazio, estamos vazios. A alma grita, mas também está vazia.
O coração luta, mas é triste a calamidade em hospitais
para que corações continuem batendo fortes na luta pelo Brasil.
E não é de se estranhar que a violência ganhe força,
a alma ganhe voz, não somos bobos,
falta moral.
A começar do governo, a começar de nós mesmos.
Deus está sempre comigo. E o vazio não tem vida.
Nem moral. A polícia está vazia, a manifestação está vazia
em sua minoria de pessoas ignorantes, mas cheia de pessoas que pensam e lutam por paz.
Vazias, precisamos de moral.
A verdade é que ninguém pode calar a nossa voz,
Se o governo pode, estamos vazios."

O que se percebe do Brasil, hoje, como em outras épocas, é que é um país sem moral. Não são só os políticos que prometem e não cumprem, e estão sempre tramando vantagens pessoais e familiares, sua próxima eleição; é o pedreiro que deixa na mão o cara que está reformando seu banheiro; é o aluno que chega invariavelmente 20 minutos atrasados; é o professor relapso que fica tomando cafezinho e esquece que tem aula; é o taxista que não sabe o trajeto (mesmo com GPS!) e dá voltas para chegar ao hotel do turista; é a empresa que leva dois meses para fazer seu contrato, paga atrasado e não deposita seu FGTS; é a companhia telefônica que lhe cobra um horror e não lhe dá linha quando você precisa; é a lei 8666 que restringe o administrador a fazer malabarismos para comprar papel higiênico e depois é assacado pelo fiscalismo inquisitorial do TCU. Em tudo e por tudo, faltam a todos nós eficiência e compromisso, para conosco mesmos e para com os outros.

O Brasil quer ser grande, sonho acalentado desde José Bonifácio. Mas suas estradas são péssimas, seus portos ineficazes e lentos, seus meios de transporte público defasados e debilitados, as grandes obras terrivelmente super-faturadas e sempre atrasadas. E muito mais.

Fazemos tudo isso de ruim por vontade própria? Sim, na medida em que são as pessoas que realizam as coisas; cada um de nós é dono de si. Não, pois elas vivem em coletividade, numa cultura que prima por esses defeitos, e que necessariamente condiciona os indivíduos a fazer o que o grupo faz.

Como sair desse pântano infernal? Alguns desistem e vão morar na Europa, nos Estados Unidos ou no Japão. Nesses países fazem de tudo, com eficiência e compromisso. Até gostam do que fazem, seja lavando pratos, trabalhando no pesado ou gerindo uma pizzaria. E, em geral, ainda se mostram felizes e alegres, quais brasileiros em sua terra natal.

Os que aqui ficam, e somos muitos, levam a vida como podem, no rame-rame moroso. Até estourar e surgirem bons motivos para repensar a vida, buscar alternativas.

A questão é a mesma da andorinha que sozinha não faz verão. O problema é: onde estão as alternativas coletivas? Como mudar, seletivamente, a sua cultura?

Aqui eu poderia fazer uma lista de sugestões que nos dão os diversos ramos da ciência e da filosofia popular. Os cientistas políticos pensam que é mudando as instituições – as eleições e os partidos, o regime político, o equilíbrio dos poderes, até clamam por uma nova constituição. Filósofos e historiadores falam em povo sem estofo, acomodados, dominados por uma elite desavergonhada e colonialista. Os educadores acham que é educando o povo, e põe retórica educativa nisso. Os crentes fervorosos acham que falta Deus. Os moralistas, bons costumes. Os cínicos, vergonha na cara. Eita, povinho ruim. Os antropólogos, laissez-faire.

A culpa é do governo federal, que devia dar o bom exemplo. Ou dos burgueses, que roubam e exploram, e o povo quer imitá-los, dizem os comentaristas políticos.

Vilém Flusser, um filósofo judeu-tcheco, que viveu seus bons vinte e tantos anos no Brasil, dizia que o brasileiro era um povo a-histórico, que não se recorda de nada do passado porque vive o presente, e isso lhe basta. Faz muita besteira, aguenta muita asneira, e segue sem pensar o futuro. Mas esse povo tem tantas qualidades humanas que um dia irá despertar por um processo coletivo de auto-consciência (e isto é quase um oxímoro) e iria ser um grande e alegre povo, um exemplo para a humanidade, na sua opinião, já tão carcomida por dentro, pelas europas.

E como se daria esse processo de auto-conscientização coletiva? Isso ele deixa para nós resolvermos.

Não sei dizer se o que se passa na atualidade brasileira tem a ver ou não com os princípios da ascensão desse inesperado processo coletivo de auto-conscientização. As marchas e passeatas de jovens, antes inermes e desiludidos, pouco interessados em se formar como adultos (que modelo de adultos eles têm?), cultuadores de beijinhos nas festas e hedonismo sem gozo, de tão pouca iniciativa política – essas passeatas inebriantes podem indicar um passo meio consciente, meio inconsciente em busca de alguma tipo de afirmação no mundo.

Na retórica desses jovens, e na sua dedicação apaixonada pela causa mais geral dos nossos tempos, habita o princípio da luta coletiva pelo nascimento de uma nova moral.

Yahoo.

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